sábado, 3 de julho de 2010

Ânfora partida

Por Jacob Klintowitz
Atordoantes rumos disparados e exposições de corpos sem identificação e o meu deslocamento guardando a minha sede e a sensação febril que transforma os elementos em uma única e estreita superfície colorida. Oh, os rumos disparados e as linhas e os contornos definidos que não encontro. Nesses lugares apenas os corpos expostos e a minha febre que os percorre procurando sempre as mesmas linhas e contornos definidos, a mesma extensão de luz. Não reconheço estes rumos, estes corpos. O deslocamento revela-me sombras e cores, mas está ausente a linha e o contorno definido e a extensão de luz e são atordoantes os rumos disparados, os corpos expostos a superfície colorida e a ausência de linha, do contorno e da extensão de luz que busco sempre.
Quem me perde? Que velocidade é esta e que superfície em cor me circula e me busca? Retorno à minha atividade que é tecer com os elementos a teia onde repouso e vivo. Posso caminhar por ela e estou protegida. É tão confortável aqui. Minha atividade é tecer a minha volta e estender-me. Os sons não fazem parte da minha teia. Onde o som que me penetrará? Quem me busca e estende esta sensação febril, esta superfície colorida, estes rumos disparados? Teço a minha teia e me estendo e construo-me e estou confortável no trabalho de mim mesmo e à minha volta há apenas o silêncio e nenhun som o penetra e estas sensações que me buscam eu as posso recolher e guardar a um canto para alguma vez tece-las e torná-las parte e extensão de mim mesmo.
Bailando a sua música desconhecida, algas estendem os seus fios e deixam que eles se cruzem e se voltem sobre si mesmo, retomem os caminhos, avancem um pouco mais, recuem, avancem, seguras do ritmo que as percorre. O som de um rio, de uma fonte, de água trabalhando suas escalas e o reflexo irisdescente sobre o corpo que é barco de si mesmo neste navegar suave e rodopiante, vestido de verde e cauda de peixes, beijado pelo sol e pela sombra, que avança e recua, indiferente às luzes que brincam na sua proa e ao seu destino de navegante que o mar joga na areia coberto de verdes e dourados.
Quem me sonha? Que música é esta e que dança me circula e envolve neste ritmo? A minha atividade é tecer à minha volta e estender-me. Os sonhos não fazem parte da minha teia. Onde o sonho me procurou? Quem me pensa e estende à minha volta esta tristeza, estas sensações coloridas e este barco no mar? Estou confortável no trabalho de mim mesmo e à minha volta há apenas o silêncio e não quero nenhum sonho. Não posso guardar e usá-lo na minha teia. Quero abrir-me e deixar que o vento o expulse, o leve para sempre, o deixe distante de mim.
Teria começado com as luzes ou com os sons? Ou não haveria separações e eu não os contemplava, mas os sentia dentro de mim, componentes da minha busca e da minha febre? E as luzes e os sons, eu os sentiria ou seríamos a mesma expressão e a mesma ânsia e a mesma angústia nesta busca e neste sonho? Na areia as marcas indistintas: por aqui terá passado uma caravana. Ondulante linha que acena o seu sim. O vento sopra estas marcas e, ora a luz, ora a sombra, não permite ver além.

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